Nesta quinta-feira (30), depois de 12 anos de atividade entre o antigo aeroporto de Parnamirim e o de São Gonçalo do Amarante, o principal agente de cargas do Rio Grande do Norte, Antônio do Vale, da Fermac Cargo & AVale Overseas Consulting, transfere oficialmente seu escritório de Natal para Recife, onde vai se instalar ao lado do terminal internacional dos Guararapes.
Com a mudança, Toninho, como é mais conhecido, revezará com o seu sócio às idas para a capital pernambucana duas vezes por mês, para não se distanciar por muito tempo da família, que continua em Natal.
Assim, ele protagoniza, pelo menos temporariamente, o final de uma história que tinha tudo para dar certo, mas que, com a saída da Lufthansa Cargo do RN também para Recife, há duas semanas, põe um fim ao sonho de transformar São Gonçalo no grande hub de cargas do Nordeste por causa de sua localização privilegiada com a Europa.
Ao invés disso, o Aeroporto Internacional Aluízio Alves, primeiro terminal totalmente privado do País, construído e operado pela empresa argentina Inframérica, que também arrematou o cobiçado aeroporto de Brasília, voltou novamente a ser um projeto para o futuro – e não para o presente.
Para piorar as coisas, ao mesmo tempo em que a Lufthansa decidiu trocar a operação local por Recife, a TAP, responsável pela rota internacional entre Natal e Portugal, anunciou voos em agosto para Recife, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Fortaleza, deixando o RN de fora. Mais um sintoma da anunciada saída da Inframérica.
Especializado na exportação de frutas frágeis e consideradas exóticas pelos europeus, com a manga e o mamão, presos aos exigentes padrões de qualidade europeu do “Read to eat” (Pronta para consumo), Antonio do Vale lembra que já chegou a exportar num único dia pelo terminal de São Gonçalo 80 toneladas durante a alta temporada, que vai de setembro ao começo do ano seguinte.
Até 2019, as exportações ali eram em média de 200 toneladas por semana com cargas não só de produtores locais, como também de Pernambuco, Paraíba, Ceará e Bahia. Mas o especialista reconhece que as instalações do aeroporto internacional Aluízio Alves são melhores do que as dos Guararapes. Ele explica as causas do encerramento da operação. “Talvez seja a falta de uma política de longo prazo para um equipamento tão estratégico e de uma atuação mais assertiva da classe política, que fez evaporar um empreendimento tão ambicioso como o aeroporto de São Gonçalo do Amarante”, analisa.
A professora dos cursos de logística do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), Karla Mota, doutora em engenharia da produção nessa área, explica que o projeto do aeroporto potiguar foi concebido para ser de cargas aeroviário, cuja primeira etapa estaria concluída ainda em 2004. Só que isso só viria a ocorrer 10 anos depois com um foco totalmente distinto do transporte de passageiros voltado para a Copa do Mundo de 2014, tendo em vista a relevância de um bom terminal aéreo para o turismo local.
“Embora não se negue a importância do transporte de passageiros para a indústria do turismo, não se pode desconhecer também a relevância do modal aéreo de cargas, já que, transportando diretamente para o destino, o custo cai bastante, atraindo fornecedores de todo o Nordeste”, acrescenta.
Karla Mota considera que, nesse sentido, a concepção original do aeroporto que veio substituir o Augusto Severo foi totalmente correta, já que manter essa operação em Parnamirim, com essa função de transporte de cargas, seria um equívoco. “Diferentemente de Parnamirim, a área escolhida em São Gonçalo tinha tudo para se transformar numa cidade portuária e o terminal num aeroporto cidade, atraindo diferentes interesses econômicos a partir de uma Zona de Processamento de Exportações”, acentua.
Para a especialista, no entanto, faltou um planejamento integrado para que houvesse um escoamento de cargas, o que foi acontecendo com o tempo e não de uma maneira assertiva e coordenada.
“E esse voo da Lufthansa, inaugurado nem 2015 e que foi embora este ano, era essencial para marcar esse diferencial do RN tanto para os exportadores de frutas quanto de pescados”, lembra.
Mas com o desejo da Inframérica de deixar o terminal, mais a pandemia do coronavírus, outras empresas que poderiam se instalar no entorno do aeroporto acabaram redirecionando seus investimentos, o que, segundo Karla Mota, foi realmente muito ruim para a economia local.
Assim, as frutas produzidas pelo RN para abastecer cerca de 300 cidades europeias e outros países ao redor do mundo perderam competitividade, já que pagarão a partir de agora um custo adicional por terra até o aeroporto de Recife. “De duas, uma: ou esse lucro é repassado para o produto, prejudicando sua competitividade, ou sairá da margem de lucro dos produtores”, afirma.
Exportações têm queda de 60% no Rio Grande do Norte, diz Ministério
O volume de valores das exportações caiu 60% no Rio Grande do Norte ao longo de 2020, segundo dados do Ministério da Economia, ao se comparar com o mesmo período do ano passado. O primeiro semestre do ano fechou com um total de U$ 127,9 milhões em vendas ao exterior, contra os US$ 205,2 milhões de 2019.
A queda nas vendas para além das fronteiras foi motivada pela pandemia do novo coronavírus. A crise sanitária afetou todo o setor produtivo potiguar voltado para o exterior. O setor de frutas foi um dos mais impactados, de acordo com as informações do Ministério, ao longo do ano.
O principal produto da pauta de vendas potiguar, a fruticultura teve redução de 63% este ano.
Entre janeiro e junho deste ano, o Rio Grande do Norte vendeu US$ 43,2 milhões em melões, melancias e mamões. No mesmo período do ano passado, o volume de vendas foi de US$ 70,7 milhões.
As exportações por via aérea também apresentaram redução ao longo do ano. Em 2020, o volume de produtos enviados através do Aeroporto Internacional Aluízio Alves, em São Gonçalo do Amarante, foi de US$ 10 milhões, contra US$ 17 milhões do ano passado. O cálculo não leva em consideração a saída da Lufthansa do terminal aéreo potiguar, ocorrida em 21 de julho. A empresa holandesa, que era responsável pelo transporte de boa parte da fruticultura potiguar, agora está operando no terminal aéreo de Recife (PE).
Em 2020, os meses de abril, maio e junho foram péssimos para a exportação potiguar. O período somado gerou US$ 27 milhões. A soma dos valores destes três meses é menor que o mês de março, inclusive, que alcançou US$ 35 milhões.
Apesar da redução dos valores em exportação em 2020, o Rio Grande do Norte segue com superávit na balança comercial. No primeiro semestre do ano, o Estado importou US$ 82,3 milhões em produtos, contra os US$ 127,9 milhões exportados. Desta forma, o saldo do período é de US$ 45 milhões. O principal produto importado é o trigo, que representou US$ 29,7 milhões.
Proprietários de terra cobram indenizações após anúncio de relicitação do terminal aéreo potiguar
Os proprietários de terrenos desapropriados para a construção do Aeroporto Internacional Aluízio Alves, em São Gonçalo do Amarante, cobram R$ 28 milhões de indenização pelo uso da terra cedida ao Governo do Estado do Rio Grande do Norte e à União para a construção do terminal aéreo.
Em 05 de junho, os advogados Diógenes da Cunha Lima, Esequias Pegado Neto e Marly Bahia, subscreveram uma notificação ao Ministério da Infraestrutura, com cópias ao Ministério do Desenvolvimento Regional, Governo do Rio Grande do Norte, Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Inframérica e Infraero. O documento pede a suspensão do processo relicitação do aeroporto potiguar, iniciado em março passado, para que a União resolva as questões relacionadas com as indenizações de posse do terreno.
O terminal áereo foi idealizado ainda na década de 1990 pela Infraero e pelo Exército. Boa parte dos terrenos no entorno do que seria o futuro aeroporto foram desapropriados no início desta década. No entanto, desde 1996, parte dos proprietários insatisfeitos com os valores da indenização ingressaram com ação judicial pedindo reparação do valor. Uma ação deste tipo, por sinal, ainda aguarda decisão no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte. O processo movido por representantes da Fazenda Arvoredo, em São Gonçalo do Amarante, está concluso para decisão desde janeiro de 2019.
Em 2011, o projeto do terminal aéreo foi transferido para a iniciativa privada – sendo o primeiro aeroporto federal a ser construído do zero pelo setor. O Aeroporto Internacional Aluízio Alves foi inaugurado em maio de 2014. O aeroporto foi construído em áreas que não pertenciam nem à União nem ao governo do Rio Grande do Norte. A administração estadual desapropriou 1,5 mil hectares que pertenciam a cerca de 300 proprietários.
Segundo o advogado Diógenes da Cunha Lima, que representa um dos proprietários, houve uma imissão precária de posse, o que permite uso do espaço mas não transfere a propriedade. Desta forma, os donos do terreno terão de receber indenização caso o terminal aéreo passe para um novo administrador. De acordo ele, um terço do território é alvo de uma disputa judicial reclamando recálculo das indenizações.
A polêmica ganhou mais força a partir de março, com o anúncio de devolução da concessão do terminal pela empresa Inframérica, que pediu indenização por supostos prejuízos ao administrar o terminal. A concessionária alegar ter investido mais de R$ 700 milhões.
A defesa dos proprietários avalia que o valor total para a indenização é de 4% do recurso investido no aeroporto. Ou seja, R$ 28 milhões. “Se a Inframérica pediu esta indenização de R$ 700 milhões, os proprietários devem ter prioridade. Não se pode conceder uso do espaço para quem não é dono”, reforça Diógenes da Cunha Lima.
Atualmente, o Ministério da Infraestrutura iniciou o processo de relicitação do aeroporto. A previsão é de que o processo aconteça no segundo semestre de 2021. Como o governo ainda não quitou a dívida e, desta forma, o processo de desapropriação não foi finalizado oficialmente, Cunha Lima diz que os proprietários seguem como os donos das terras. “Temos todo o interesse de que o aeroporto continue a funcionar, mas os proprietários de terra, que há 20 anos aguardam por uma definição, não querem ficar por último no pagamento de indenização”, encerrou.
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